domingo, 13 de julho de 2014

A lenda da apendicite

Doses de azedume me vieram à boca. Soube de imediato que era meu apêndice se revoltando...
Reza a lenda que:

"Quando o homem era um, duo e trio. Tudo em uma tacada só... O apêndice era o órgão mais importante de todo o corpo humano. Era o responsável por proteger todo indivíduo de si mesmo, de apaziguar suas próprias almas e harmonizar todas as energias que provinham do interno.
Existia uma competição muito acirrada entre o cérebro e o coração pelo comando do corpo. Ambos uns otários.
 'A complacência da lógica matriz geradora de animosidade e passividade no humano é alinhada com o sistema nervoso e sendo assim eu como cabeça pensante e único órgão racional comprovo minha existência unanime como inevitável e majoritária.' Sem vírgulas, o cérebro encontrava razões.
'Sou um lutador, dê-me amor." Com rimas rasas, o coração clamava vivências.
O apêndice não se abalava, não precisava. Integrava o corpo em um. A individualidade em duas - razão e emoção. E a essência em três pronomes - Eu, Tu e Ele.

Haviam falhas, motins e revoltas.
Os capilares -cardio ou não-, as unhas e secreções todas desejam sair daquilo o quanto antes... A unicidade era mortífera.
Os rins, pulmões e pés sempre acreditavam que a dualidade não era suficiente, e além do mais... O impuro, a falta de ar e a realidade do chão era mais que necessários para os ditos majores Coração e Cérebro.
Já os chefes, tinham problemas com os pronomes... 'A essência deveria ser mostrada e comprovada. Sugiro impor, ou imponho sugerindo, como pilar Este, Esse e Aquele', dogmatizava o racional.
'Deveríamos ter e ser, tecer... Meu, Seu e Nosso a se estabelecer.' O emotivo divagava.
Com isso o apêndice conseguiu se virar. Não literalmente, apenas lidando mesmo.

Porém, certo dia - Coincidentemente após uma paixão - o cérebro, drogado por hormônios, resolveu contar vontades, vantagens, verdades:
'Você, meu, caro, amigo, coração, é, um, otário... ... Quem - rege - as - emoções- sou - eu - seu - cretino... ... Se tu queres quebrar-se, faça-o sozinho.'
O coração perdeu as estribeiras, correu forte no mesmo lugar, deu voltas em si mesmo, sobrecarregou o olhar. Até o apêndice tentar lhe acalmar.
Foi aí que o equilíbrio tão apendido foi surrado. O coração bateu, bateu, bateu até não poder, e determinado falou: "Se não posso parar, nunca mais vou parar."
O anexo, aprendido, se resignou a inflamar. Com choro ou não, a dor não esgotará.

O cérebro, tão ciente e ausente, resolveu dispensar toda harmonia, toda unção e toda unidade de seu cargo de dever. E o apêndice não precisou mais lutar, ou não quis mais apanhar - nunca se soube bem. Só sabemos que desde de então 'O apêndice não serve pra nada'.
Se você já teve um apêndice linchado, amargo e saturado... Você entenderá. A dor que lhe causaram, adjunto ao psicossomático, é liberada ao poucos como doses homeopáticas de rancor.

Apendicite nada mais é que o choro de um órgão, exaurido de forças e tomado de amargor."

Já quebraram meu coração. Já confundiram meu cérebro...
Mas a pior das dores... É a causada pelo vingativo e depressivo apêndice.

*Adendo: Jones

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